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Como árvore que sou - Lília Tavares / Joaquim Pessoa

Como árvore que sou
 adormeço a sossegar as minhas folhas e
 os pássaros transparentes que se agitam nos ninhos
 da minha inquietação.
 Sei de cor os sonhos dos ventos
 que balançam este corpo tronco
 onde dedos vegetais bastam
 o rumor das seivas silenciosas. A noite
 propaga o ardor da ternura até às minhas raízes
 que vão bebendo lentamente as lágrimas de um vento azul,
 cuja dor deambula sobre as pedras, em oração à terra,
 para vir confortar-se em silêncio no mais fundo de mim.
 Escondo por dentro do nada os segmentos de estrelas
 que restaram da partida dos pólenes. Flutuam
 na quietude das noites claras onde a chama do leito
 de açúcares permanece, visível no limbo da noite.

 Demoro neste entorpecimento idealizado o termo, os
 renovados filhos da gravidez da terra
 e do incontrolado cio dos relâmpagos. Em mim
 o verde se transforma em música, essa música sem tempo,
 que lembra toda a noite da floresta, toda a serenidade
 dos lagos, toda a doçura do ventre das baías.
 Como árvore que sou, amo o vôo do pássaro e a
 lonjura da terra. E sou a terra. E sou o pássaro.
 E a raiz do amor. E a raiz da sombra. E a raiz solar
 que me erguerá até à luz que me fascina
 e me beija docemente a cabeleira lavada
 de esperança. Sou a árvore. Um rio
 de vida que sobe lentamente
 as colinas do céu.