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Poema à minha vida - Vieira Calado

A minha vida é o que eu penso que é a minha vida,
um golpe de vento o que eu penso ser um golpe de vento.

Vejo no vaivém das ondas apenas a ligeireza das ondas,
a mesma sensualidade das areias que arrastam o vento
e por ele se deixam arrastar numa profunda comunhão
como a água que cai sobre as águas, sem angústia.

E nunca me arrependo de olhar o azul, fazer um gesto
de vigiar o céu, à procura duma estrela imperturbável
apenas a dizer que está ali, longe, contemplando a terra.



Aqui tudo é silêncio - Vieira Calado

Aqui tudo é silêncio entre estas árvores
que assobiam em silêncio.

Tudo é sereno como a distância,
a abstracta viuvez dum musgo.

Aqui me atenho, hoje, no fugas momento
das seivas que iluminam o frio do tempo

neste dilúvio perecível devaneio
da eterna ausência e essência inerte.



Azul dos Pássaros - Vieira Calado

Sonhamos voar azul dos pássaros –
uma grinalda branca para enfeitar um rosto de mulher,
um cavalo de sangue lusitano no coração dum réptil.

De tempos a tempos desenterramos um diamante
dentro duma ostra
(que nunca nos pertence),
mas resistimos

porque as águas caiem escorrendo sobre a fronte
porque a cidade se estende no interior
das árvores
porque as árvores se justificam na solidão dos ares.



Paisagem - Vieira Calado


Percorro esta paisagem com os olhos
e vejo grandes árvores perfiladas contra o vento,
mas o vento é a luz que esvanece nos meus olhos
as árvores que não vejo como vejo ou imagino.
Nos meus olhos há florestas
ervas que se erguem para ser árvores
no seio interior da paisagem,
esta paisagem que eu percorro com os olhos.
E é esse o caminho liberto a esvoaçar em bandos de aves
que vêm de longe, donde o vento sopra
o ânimo dum milagre feito mágica
de azuis e verdes no cinzento da minha terra.


Poema às flores de outono - Vieira Calado


Agora vou reclinando o corpo
entre a terra e as estrelas.

O espaço é breve
para a brisa do mar
que ainda soa.

E no entanto adormeço
no meu sonho,
sereno de harmonias

incendiando o fino pó
da terra
com estas flores violentas,
exíguas, do outono.


http://vieiracalado-poesia.blogspot.com


O segredo dos pássaros – Vieira Calado


O coração conhece o segredo dos pássaros,
a ânsia de horizontes para além do horizonte.

O segredo dos pássaros é uma centelha
de luz rebuscando a simplicidade duma vida

imagens móveis que alargam o nosso chão,
apenas em memórias difusas de exiguidade
e fantasmas de veludo passando mãos inertes
sobre o nosso rosto.

Ou labaredas azuis duma tarde quente
e o fio dum arco-íris
em suas cores de transparência e frio.

O coração conhece o segredo dos pássaros
e o seu degredo.


E eu apenas recomeço os trabalhos
da simplicidade da minha vida
e reconheço a sua exiguidade
guiada por horizontes de bruma.

http://vieiracalado-poesia.blogspot.com