Ainda hoje ouço o rumor dos remos na laguna.
Eles cortam as águas como se escavassem a terra
e separassem o amanhecer dos prodígios do dia.
A canoa desliza lentamente entre os mangues verdes e emaranhados
e a promessa do mar que fulge na foz deserta.
Os remos espalham cicatrizes na água ferida
que se abre e se refaz. A vida não é só o rumor
ou o gotejar dos remos. É também o silêncio
aberto como um pálio sobre os corpos inclinados para a água
e as almas condenadas à incerteza e ao desamparo.
Há um tempo de falar e um tempo de calar;
um tempo de dizer e um tempo de silenciar
após a aprendizagem do dia e a viagem na canoa
que sulca serenamente as águas da laguna e haverá de voltar
ao atracadouro onde a água e a terra
são verdades inseparáveis como a vida e a morte.
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