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Asas - Inez Andrade Paes

foste com as andorinhas 
pousada no negro azul brilhante das asas

quero ir também

partiste com elas sem dizer

volta
na próxima primavera que te quero
olhar no dorso dela

já     ambas
vestidas de África

volta
traz-me agora as nuvens
mesmo as que trazem água

se não conseguir voar
receberei no rosto essa água 
marinha


Poema 18 - Inez Andrade Paes


transfiro a carga 
para um outro barco 
de proa mais largo

equilibra em cada vaga alta
mas não se afunda

as gotas pesadas que ainda batem
no convés lavado
transparecem na penumbra
quando a lua aparece
e o mar reflete barcos



Mãos de Prata - Inez Andrade Paes


vento
minhas mãos são de prata

o vento disse     nada

vento
minhas mãos são de oiro

o vento disse     nada

vento
minhas mãos são de água

o vento disse
lavas-me a alma manchada

vento
minhas mãos são de pedra

o vento disse     nada

vento
minhas mãos são de pano

o vento disse
enxugas-me as lágrimas de areia que trago da África

vento
minhas mãos são raízes

o vento disse
penteio contigo teus longos cabelos nas noites estreladas

vento
porque minhas mão são de vidro

o vento disse
para poder espreitar por elas teu sorriso vivo

vento
sopra em minhas mãos de prata
de oiro
de pedra
e faz um caminho largo


Poema 6 - Inez Andrade Paes


chegaria sem ti
se a estrada não fosse tão longa
e ao longe não visse senão
o horizonte a tremer

meu andar confunde-se com a poeira
entre passadas duras a cambar
de desespero por te encontrar

chegaria sem ti
se a estrada não fosse tão longe
com pedras de bicos entre meus ossos
e o capim raso e seco sem chuva a amaciar

gostava de chegar até ti
se a estrada não fosse tão comprida
como o fio de arame que desenrola
sem curvas visíveis e outras a apertar

chegaria até ti
se a estrada não prendesse meu cabelo
nos ramos do embondeiro e me quisesse lá

chegaria por ti
assim a estrada abrisse
para começar a andar

chego até ti
mas não te vejo
para recomeçar