em nosso peito, pai, mora o frescor das gabirobas
amontoadas em sacos escuros de onde saíam folhas
de alguma floresta escura que penetravas sozinho
o cheiro enchia a cozinha a mãe corria para
apanhar as vasilhas os cachorros latiam sua sombra
nós espremíamos o sumo nos dentes e a penumbra
pairava nos bagos dos bosques açucarados
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Rodas - Vera Lúcia de Oliveira
minha infãncia era cheia de trens
também minha adolescência se encheu
de rodas
de manhã acordo
aprendo:
a vida está
é
paralisia é o nome mais doloroso que tem a morte
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o olho - Vera Lúcia de Oliveira
o olho do escuro
tem pestanas frescas
escuto o piscar doído
o assombro da pupila
vasta
varrendo miados
frufrus de vento
tropeço de alguma estrela
no céu
conversas planas de postes
mascando nacos de noite
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tormenta - Vera Lúcia de Oliveira
o mar arremessava-se
contra o céu
a espuma rangia
e uns bicos de aves doídas
batiam na alma
batiam na alma
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infância - Vera Lúcia de Oliveira
perdi-me em funduras de juntas
perdi bichos nas moitas, rastros no escuro
perdi mormaços, brisas
fui gerando meu pisado vagaroso
nas fraturas das coisas
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para dentro - Vera Lúcia de Oliveira
como águas que jorram
para dentro
dei para pisar
o rangido dos ventos
dei para virar
em volta dos passos
dei para lavrar a veia
em que piso
dei para revolver
os ossos
para dentro
dei para pisar
o rangido dos ventos
dei para virar
em volta dos passos
dei para lavrar a veia
em que piso
dei para revolver
os ossos
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ferrolhos - Vera Lúcia de Oliveira
de uma cidade vim
que mora dentro de mim
nasci madura no dentro
de mãe serenando vento
num branco de madrugada
rasgado de trovoada
e vária, larga de olho
a cutucar os ferrolhos
que mora dentro de mim
nasci madura no dentro
de mãe serenando vento
num branco de madrugada
rasgado de trovoada
e vária, larga de olho
a cutucar os ferrolhos
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até o fundo - Vera Lúcia de Oliveira
eu cavoucava o barulhinho
das coisas
eu cutucava pedras
eu machucava a terra
eu revolvia os veios
dos troncos
eu escavava até o fundo
a mudez de um junco
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bicicletinhas na tarde - Vera Lúcia de Oliveira
vejo crianças na fúria
de fabricar voragens de vento
estralam seus pedais
correm mais do que a dor
mais do que o tempo
correm contra a dureza
do muro
e da noite
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