Morre a tarde. Erra no ar a divina fragrância.
Fora, a mortiça luz dos crepúsculos arde.
Nas árvores, no oceano e no azul da distância
Morre a tarde...
Morrem as rosas. Minhas pálpebras se molham
No pranto das desesperanças dolorosas.
Sobre a mesa, pétala a pétala, se esfolham,
Morrem as rosas...
Morre o teu sonho?... Neste instante o pensamento
Acabrunha o meu ser como um pesar medonho.
Ah, por que temo assim? Dize: neste momento
Morre o teu sonho?
Versos escritos n'água - Manuel Bandeira
Os poucos versos que aí vão,
Em lugar de outros é que os ponho.
Tu que me lês, deixo ao teu sonho
Imaginar como serão.
Neles porás tua tristeza
Ou bem teu júbilo, e, talvez,
Lhes acharás, tu que me lês,
Alguma sombra de beleza...
Quem os ouviu não os amou.
Meus pobres versos comovidos!
Por isso fiquem esquecidos
Onde o mau vento os atirou.
Em lugar de outros é que os ponho.
Tu que me lês, deixo ao teu sonho
Imaginar como serão.
Neles porás tua tristeza
Ou bem teu júbilo, e, talvez,
Lhes acharás, tu que me lês,
Alguma sombra de beleza...
Quem os ouviu não os amou.
Meus pobres versos comovidos!
Por isso fiquem esquecidos
Onde o mau vento os atirou.
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Manuel Bandeira
Soneto dos vinte anos - Lêdo Ivo
Que o tempo passe, vendo-me ficar
no lugar em que estou, sentindo a vida
nascer em mim, sempre desconhecida
de mim, que a procurei sem a encontrar.
Passem rios, estrelas, que o passar
é ficar sempre, mesmo se é esquecida
a dor de ao vento vê-los na descida
para a morte sem fim que os quer tragar.
Que eu mesmo, sendo humano, também passe
mas que não morra nunca este momento
em que eu me fiz de amor e de ventura.
Fez-me a vida talvez para que amasse
e eu a fiz, entre o sonho e o pensamento,
trazendo a aurora para a noite escura.
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Lêdo Ivo
Tudo, todos e o todo - Carlos Rodrigues Brandão
Somos feitos de barro e do fogo
e por isso somos o desejo e o amor.
Fomos feitos de terra e de água
e assim somos eternos como a vida
e somos passageiros como a flor.
Somos a luz a sombra, o claro, a escuridão
a memória de deus, a história e a poesia.
Somos o espaço e o tempo, a casa e a janela
e a noite e o dia, e o sol e o céu e o chão.
Somos o silêncio e o som da vida.
O estudo, a lembrança e o esquecimento.
Somos o medo e o abandono.
A espera somos nós e somos a esperança.
Pois não somos mais e nem menos do que o todo
e nem somos menos e nem mais que tudo.
Somos o perene e o momento, a pedra e o vento
a energia e a paz, a vida criada e o criador.
Somos o mundo que sente, e irmãos da vida
somos a aventura de ser vida e sentimento.
E assim em cada ave que voa há nossa alma,
e em cada ave que morre, a nossa dor.
e por isso somos o desejo e o amor.
Fomos feitos de terra e de água
e assim somos eternos como a vida
e somos passageiros como a flor.
Somos a luz a sombra, o claro, a escuridão
a memória de deus, a história e a poesia.
Somos o espaço e o tempo, a casa e a janela
e a noite e o dia, e o sol e o céu e o chão.
Somos o silêncio e o som da vida.
O estudo, a lembrança e o esquecimento.
Somos o medo e o abandono.
A espera somos nós e somos a esperança.
Pois não somos mais e nem menos do que o todo
e nem somos menos e nem mais que tudo.
Somos o perene e o momento, a pedra e o vento
a energia e a paz, a vida criada e o criador.
Somos o mundo que sente, e irmãos da vida
somos a aventura de ser vida e sentimento.
E assim em cada ave que voa há nossa alma,
e em cada ave que morre, a nossa dor.
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Navegar - Walt Whitman
Ó, partir para o mar, navegar num navio!
Deixar este chão, terra firme, tediosa,
Deixar a enfadonha mesmice das ruas,
Das calçadas e casas,
Deixar-te, ó sólida terra, ó terra imóvel,
E embarcar num navio.
Navegar, navegar, navegar!
Ó, ser-me a vida agora um poema de júbilos novos!
E dançar, bater palmas, saltar, exultar,
E pular, e rolar, flutuar!
Ser marujo do mundo inteiro,
A caminho de todos os portos,
Ser o próprio navio -
(vede as velas que eu iço
Ao sol e ao ar) -
Ser um ágil navio, enfunado, ligeiro,
Cheio de ricas palavras, de júbilos cheio!
Deixar este chão, terra firme, tediosa,
Deixar a enfadonha mesmice das ruas,
Das calçadas e casas,
Deixar-te, ó sólida terra, ó terra imóvel,
E embarcar num navio.
Navegar, navegar, navegar!
Ó, ser-me a vida agora um poema de júbilos novos!
E dançar, bater palmas, saltar, exultar,
E pular, e rolar, flutuar!
Ser marujo do mundo inteiro,
A caminho de todos os portos,
Ser o próprio navio -
(vede as velas que eu iço
Ao sol e ao ar) -
Ser um ágil navio, enfunado, ligeiro,
Cheio de ricas palavras, de júbilos cheio!
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Walt Whitman
E toda a noite a chuva veio - Fernando Pessoa
E toda a noite a chuva veio
E toda a noite não parou,
E toda a noite o meu anseio
No som da chuva triste e cheio
Sem repousar se demorou.
E toda a noite ouvi o vento
Por sobre a chuva irreal soprar
E toda a noite o pensamento
Não me deixou um só momento
Como uma maldição do ar.
E toda a noite não dormida
Ouvi bater meu coração
Na garganta da minha vida.
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Passeio - Cecília Meireles
Quem me leva adormecida
por dentro do campo fresco,
quando as estrelas e os grilos
palpitam ao mesmo tempo?
O céu dorme na montanha,
o mar flutua em si mesmo,
o tempo que vai passando
filtra a sombra nas areias.
Quem me leva adormecida
sobre o perfume das plantas,
quando, no fundos rios
a água é nova a cada instante?
Não há palavras nem rostos:
eu mesma não me estou vendo.
Alguém me tirou do corpo,
fez-me nome, unicamente,
nome, para que as perguntas
me chamem, com vozes tristes,
e eu não me esqueça de tudo
se houver um dia seguinte.
O céu roda para oeste:
as pontes vão para as águas.
O vento é um silêncio inquieto
com perspectivas de barcos.
Quem me leva adormecida
pelas dunas, pelas nuvens,
com este som inesquecível
do pensamento no escuro?
por dentro do campo fresco,
quando as estrelas e os grilos
palpitam ao mesmo tempo?
O céu dorme na montanha,
o mar flutua em si mesmo,
o tempo que vai passando
filtra a sombra nas areias.
Quem me leva adormecida
sobre o perfume das plantas,
quando, no fundos rios
a água é nova a cada instante?
Não há palavras nem rostos:
eu mesma não me estou vendo.
Alguém me tirou do corpo,
fez-me nome, unicamente,
nome, para que as perguntas
me chamem, com vozes tristes,
e eu não me esqueça de tudo
se houver um dia seguinte.
O céu roda para oeste:
as pontes vão para as águas.
O vento é um silêncio inquieto
com perspectivas de barcos.
Quem me leva adormecida
pelas dunas, pelas nuvens,
com este som inesquecível
do pensamento no escuro?
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Delicadeza - Roseana Murray
A alma é invisível
um anjo é invisível
o vento é invisível
o pensamente é invisível
e no entanto
com delicadeza
se pode enxergar a alma
se pode adivinhar o anjo
se pode sentir o vento
se pode mudar o mundo com alguns
pensamentos...
um anjo é invisível
o vento é invisível
o pensamente é invisível
e no entanto
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se pode enxergar a alma
se pode adivinhar o anjo
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Roseana Murray
É preciso não esquecer nada - Cecília Meireles
É preciso não esquecer nada:
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.
É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.
O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.
O que é preciso esquecer é o dia carregado de atos,
a idéia de recompensa e de glória.
O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos
severos conosco, pois o resto não nos pertence.
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.
É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.
O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.
O que é preciso esquecer é o dia carregado de atos,
a idéia de recompensa e de glória.
O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos
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Cecília Meireles
Amai-vos... - Gibran Kahlil Gibran
Amai-vos um ao outro,
mas não façais do amor um grilhão.
Que haja, antes, um mar ondulante
entre as praias de vossa alma.
Enchei a taça um do outro,
mas não bebais da mesma taça.
Dai do vosso pão um ao outro,
mas não comais do mesmo pedaço.
Cantai e dançai juntos,
e sede alegres,
mas deixai
cada um de vós estar sozinho.
Assim como as cordas da lira
são separadas e,
no entanto,
vibram na mesma harmonia.
Dai vosso coração,
mas não o confieis à guarda um do outro.
Pois somente a mão da Vida
pode conter vosso coração.
E vivei juntos,
mas não vos aconchegueis demasiadamente.
Pois as colunas do templo
erguem-se separadamente.
E o carvalho e o cipreste
não crescem à sombra um do outro.
mas não façais do amor um grilhão.
Que haja, antes, um mar ondulante
entre as praias de vossa alma.
Enchei a taça um do outro,
mas não bebais da mesma taça.
Dai do vosso pão um ao outro,
mas não comais do mesmo pedaço.
Cantai e dançai juntos,
e sede alegres,
mas deixai
cada um de vós estar sozinho.
Assim como as cordas da lira
são separadas e,
no entanto,
vibram na mesma harmonia.
Dai vosso coração,
mas não o confieis à guarda um do outro.
Pois somente a mão da Vida
pode conter vosso coração.
E vivei juntos,
mas não vos aconchegueis demasiadamente.
Pois as colunas do templo
erguem-se separadamente.
E o carvalho e o cipreste
não crescem à sombra um do outro.
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Gibran Kahlil Gibran
Ar de Noturno - Garcia Lorca
Tenho muito medo
das folhas mortas,
medo dos prados
cheios de orvalho.
eu vou dormir;
se não me despertas,
deixarei a teu lado meu coração frio.
O que é isso que soa
bem longe?
Amor. O vento nas vidraças,
amor meu!
Pus em ti colares
com gemas de aurora.
Por que me abandonas
neste caminho ?
Se vais muito longe,
meu pássaro chora
e a verde vinha
não dará seu vinho.
O que é isso que soa
bem longe?
Amor. O vento nas vidraças,
amor meu!
Nunca saberás,
esfinge de neve,
o muito que eu
haveria de te querer
essas madrugadas
quando chove
e no ramo seco
se desfaz o ninho.
O que é isso que soa
bem longe?
Amor. O vento nas vidraças,
amor meu!
das folhas mortas,
medo dos prados
cheios de orvalho.
eu vou dormir;
se não me despertas,
deixarei a teu lado meu coração frio.
O que é isso que soa
bem longe?
Amor. O vento nas vidraças,
amor meu!
Pus em ti colares
com gemas de aurora.
Por que me abandonas
neste caminho ?
Se vais muito longe,
meu pássaro chora
e a verde vinha
não dará seu vinho.
O que é isso que soa
bem longe?
Amor. O vento nas vidraças,
amor meu!
Nunca saberás,
esfinge de neve,
o muito que eu
haveria de te querer
essas madrugadas
quando chove
e no ramo seco
se desfaz o ninho.
O que é isso que soa
bem longe?
Amor. O vento nas vidraças,
amor meu!
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Garcia Lorca
Do vale à montanha - Fernando Pessoa
Do vale à montanha,
Da montanha ao monte, cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por casas, por prados,
Por Quinta e por fonte,
Caminhais aliados.
Do vale à montanha,
Da montanha ao monte,
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por penhascos pretos,
Atrás e defronte,
Caminhais secretos.
Do vale à montanha,
Da montanha ao monte,
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por quanto é sem fim,
Sem ninguém que o conte,
Caminhais em mim.
Da montanha ao monte, cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por casas, por prados,
Por Quinta e por fonte,
Caminhais aliados.
Do vale à montanha,
Da montanha ao monte,
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por penhascos pretos,
Atrás e defronte,
Caminhais secretos.
Do vale à montanha,
Da montanha ao monte,
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por quanto é sem fim,
Sem ninguém que o conte,
Caminhais em mim.
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Fernando Pessoa
Judeu errante - Vinícius de Moraes
Hei de seguir eternamente a estrada
Que há tanto tempo venho já seguindo
Sem me importar com a noite que vem vindo
Como uma pavorosa alma penada
Sem fé na redenção, sem crença em nada
Fugitivo que a dor vem perseguindo
Busco eu também a paz onde, sorrindo
Será também minha alma uma alvorada
Onde é ela? Talvez nem mesmo exista...
Ninguém sabe onde fica... Certo, dista
Muitas e muitas léguas de caminho...
Não importa. O que importa é ir em fora
Pela ilusão de procurar a aurora
Sofrendo a dor de caminhar sozinho.
Que há tanto tempo venho já seguindo
Sem me importar com a noite que vem vindo
Como uma pavorosa alma penada
Sem fé na redenção, sem crença em nada
Fugitivo que a dor vem perseguindo
Busco eu também a paz onde, sorrindo
Será também minha alma uma alvorada
Onde é ela? Talvez nem mesmo exista...
Ninguém sabe onde fica... Certo, dista
Muitas e muitas léguas de caminho...
Não importa. O que importa é ir em fora
Pela ilusão de procurar a aurora
Sofrendo a dor de caminhar sozinho.
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Canção tonta - Federico Garcia Lorca
Mama.
Eu quero ser de prata.
Filho,
Terás muito frio.
Mama,
eu quero ser de água.
Filho,
Terás muito frio.
Mama.
Borda-me em teu travesseiro.
Isso sim!
Agora mesmo!
Eu quero ser de prata.
Filho,
Terás muito frio.
Mama,
eu quero ser de água.
Filho,
Terás muito frio.
Mama.
Borda-me em teu travesseiro.
Isso sim!
Agora mesmo!
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Mostrador - Cassiano Ricardo
O ponteiro grande
dá volta ao mundo
de hora em hora;
já o pequeno, não.
Parece-nos parado.
Parado entre o futuro
e o tempo ido.
Irmãos do desencontro:
Um, o ponteiro
da esperança, o outro
o do olvido.
O ponteiro grande
gorjeia de hora em hora.
O pequeno é silente:
Todas as coisas
que caminham pra não
voltar, caminham
assim: Imóvelmente.
Horizonte. Atributo
do último minuto.
dá volta ao mundo
de hora em hora;
já o pequeno, não.
Parece-nos parado.
Parado entre o futuro
e o tempo ido.
Irmãos do desencontro:
Um, o ponteiro
da esperança, o outro
o do olvido.
O ponteiro grande
gorjeia de hora em hora.
O pequeno é silente:
Todas as coisas
que caminham pra não
voltar, caminham
assim: Imóvelmente.
Horizonte. Atributo
do último minuto.
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