Que seja doce - Caio Fernando Abreu

Repito todas as manhãs,
ao abrir as janelas para deixar
entrar o sol ou o cinza dos dias,
bem assim: que seja doce.
Quando há sol, e esse sol bate
na minha cara amassada do sono
ou da insônia,
contemplando as partículas de poeira soltas no ar,
feito um pequeno universo,
repito sete vezes para dar sorte:
que seja doce que seja doce que seja doce
e assim por diante.
Mas, se alguém me perguntasse
o que deverá ser doce,
talvez não saiba responder.
Tudo é tão vago como se fosse nada.
Ninguém perguntará coisa alguma, penso.
Depois continuo a contar para mim mesmo,
como se fosse ao mesmo tempo
o velho que conta e a criança que escuta,
sentado no colo de mim.

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